Contardo, inépuisable / Contardo, inesgotável

Contardo, inépuisable

Ce mardi 30 mars, nous avons perdu Contardo Calligaris. Souffrant d’un cancer depuis quelque temps, il était soigné à l’hôpital Albert Einstein de São Paulo.

Immense perte et tristesse pour le Brésil, pour les brésiliens, les psychanalystes mais pas simplement… car, et depuis fort longtemps, son bouillonnement intellectuel ne pouvait pas se contenter du milieu psychanalytique. Peut-être bien depuis toujours, du fait de sa formation, de sa curiosité insatiable.

À la fin des années 60, son temps genevois avec Roger Dragonetti, Jean Starobinski, et Georges Steiner alterne avec celui de l’expérience psychanalytique lors de ses séjours à Paris. C’est le début d’une succession de déplacements, géographiques certes, mais surtout intellectuels. S’ensuit son entrée à l’École freudienne de Paris, où, tout en fréquentant le petit cercle de doctorants de Roland Barthes à l’EHESS, son regard porte jusqu’à l’outre-Atlantique, la contre-culture américaine.

Concernant son apport à la psychanalyse, j’aurais tant à dire… Limitons nous à ses contributions sur les psychoses. La publication en français en 1991 Pour une clinique différentielle des psychoses (Point Hors Ligne) est la transcription de sept conférences prononcées à Porto Alegre en 1988. Cette publication connaitra même une version japonaise. Nous y lisons les thèses de ses débuts en 84-85, en contrepoint à l’égard de l’abord lacanien de ces années-là. La référence n’est pas la paranoïa mais la schizophrénie. L’aphorisme de la forclusion du Nom-du-Père ne lui suffit pas pour ce qu’il prétend, cerner la structure avant toutes manifestations dites positives, et tout cela, et peut-être bien pour cela, sans une seule occurrence à l’objet petit a.

J’admets n’avoir rien compris lors de ma première lecture de ce texte en 1997.

Allez, il est temps de…

Les mots pour conclure ne peuvent être que les siens, ses derniers mots, ceux qu’il a prononcés à son fils peu avant de nous quitter.

Alfredo GIL


Contardo, inesgotável

Nesta terça-feira, 30 de março, Contardo Calligaris nos deixou. Há algum tempo sofrendo de um câncer, ele vinha sendo tratado no hospital Albert Einstein de São Paulo.

Perda e tristeza imensas para o Brasil, para os brasileiros, para os psicanalistas, mas não somente, pois há muito tempo seu anseio intelectual não se contentava mais apenas com o meio psicanalítico. Talvez tenha sido sempre assim, tendo em vista a sua formação, a sua curiosidade insaciável.

No final da década de 1960, sua passagem por Genebra, com Roger Dragonetti, Jean Starobinski e Georges Steiner, intercala-se com a experiência psicanalítica durante suas estadas em Paris. É o início de uma sucessão de deslocamentos, evidentemente geográficos, mas, sobretudo, intelectuais. Isso o leva a fazer parte da Escola Freudiana de Paris e, ao mesmo tempo que frequenta o pequeno círculo de doutorandos de Roland Barthes na Escola de Estudos Avançados em Ciências Sociais (EHESS), seu olhar se volta ao outro lado do Atlântico, à contracultura americana.

Rapidamente, qualquer espaço se torna estreito demais para a dimensão intelectual desse milanês que se expandirá a outros horizontes. Assim, de 1986 a 1988, ele trabalha e circula entre Paris, Porto Alegre e São Paulo, trocando de lugar a cada dois meses. Então, parte de Paris definitivamente para instalar-se no Brasil em um momento tão difícil que os próprios brasileiros sonham deixar o país. Ir contra a corrente para encontrar outros sentidos fazia de Contardo um “Contrário”, como gostava de brincar consigo mesmo. Depois, de 1994 a 2004, decide prolongar a experiência clínica em terra anglófona, lecionando no departamento de estudos culturais na New School for Social Research, em Nova Iorque, e antropologia médica na Universidade de Berkeley. Dez anos durante os quais ele voltava, mensalmente, para reencontrar sua terra “paulistana” e seus pacientes.

A moradia desse “sem fronteiras” não era fixa em um só país. E sua voz de psicanalista não se reduzia a uma única via de comunicação, nem a uma única língua. Em 1989, ele funda, junto a outros, a tão ativa e produtiva Associação Psicanalítica de Porto Alegre. Mais tarde, o importante jornal Folha de S. Paulo o convida a manter um espaço semanal entre suas páginas. Desde 1999, até o mês passado, sua coluna da quinta-feira tocava, interessava, desconcertava e incomodava todos os públicos. Como o próprio diretor da redação poderia afirmar, essa era uma das colunas mais lidas do jornal.

Além da sua desenvoltura com a oralidade a serviço da transmissão, seus escritos o levam à publicação de dois romances: O Conto do Amor (2008) e A Mulher de Vermelho e Branco (2011). No intervalo entre os dois, lhe propõem um desafio como dramaturgo, que ele aceita com O Homem da Tarja Preta (2009). Para o ser prolífico que ele é, não há razão para parar por aí: a HBO o contrata para ser o criador de uma série cujo personagem principal é ninguém menos que o protagonista dos seus romances. Lançada em 2014, a série Psi foi indicada em 2015 e 2018 ao Emmy Internacional e teve um total de quatro temporadas e 32 episódios.

Jacques Nassif:

Bem, não! E alguns estão irritados:

Admito que não entendi nada quando li seu texto pela primeira vez em 1997. A dificuldade é constatada por outro colega, que também já nos deixou.

Michel Demangeat:

— Contardo Calligaris inspirara, em parte, a orientação deste colóquio por meio de suas publicações. Sua apresentação, como dissemos a ele, mostrou perspectivas um tanto diferentes.

Contardo Calligaris irradiou-se por cada lugar onde esteve. Eu, como muitos brasileiros, mal cheguei à França e já fui “transferido” para uma de suas casas parisienses assim que desembarquei no aeroporto Charles de Gaulle. Viria a descobrir, então, o seminário do Dr. Jean Bergès, suas consultas com crianças, bem como o seminário do Dr. Charles Melman, alcançando o passe que essa transferência me proporcionou.

As palavras finais não poderiam ser outras a não ser as suas próprias, suas últimas palavras, ditas ao seu filho antes de partir:

“Espero estar à altura”.

Alfredo Gil.